02 junho 2009

A Copa de 2014 e a política II

Na 'Folha' de ontem( domingo)

Órgão responsável por seleção, Comitê Executivo da Fifa é composto por 25 integrantes, entre eles Ricardo Teixeira

Lista de casos envolve até o comandante da Fifa e vai de desfalques milionários a desvios de ingressos e venda de camisas falsificadas

DO ENVIADO A NASSAU

O anúncio das cidades-sede da Copa do Mundo de 2014 determinará a prioridade do investimento federal sobre 12 capitais nos próximos anos.

O governo se comprometeu a bancar a infraestrutura do evento.

A escolha que determinará o destino desses recursos, porém, passou longe de Brasília.

Foi feita por um grupo técnico da Fifa, juntamente com a CBF.

Mas quem bate o martelo são os 25 homens do Comitê Executivo da Fifa.

Só um é brasileiro -o presidente da CBF, Ricardo Teixeira.

Todos foram eleitos em pleitos que só envolveram cartolas de suas confederações.

Vários deles já sofreram acusações de ilegalidades financeiras ou políticas.

Quem encabeça a lista de problemas é o presidente da Fifa, Joseph Blatter.

Em sua gestão, o então secretário-geral, Michel Zen-Ruffinen, acusou Blatter de ter feito gastos irregulares, somando prejuízo de 360 milhões de libras (mais de R$ 1 bilhão) para a entidade.

Uma das acusações era a de que ele pagara de forma irregular 69 mil libras ao russo Viacheslav Koloskov.

Na época, Koloskov não era do Comitê Executivo, mas recebeu verba como se fosse.

Hoje, ele está de volta ao órgão máximo da Fifa.

Por conta disso, 11 membros do Comitê Executivo da Fifa acusaram Blatter, em denúncia criminal, de utilizar dinheiro da entidade para comprar votos.

A disputa precedia a eleição de 2002 para a presidência.

Sob pressão, Blatter reconheceu erros e reviu determinados procedimentos dentro da entidade.

Foi reeleito, e o ex-secretário-geral saiu da Fifa.

A denúncia foi retirada.

A crise financeira da Fifa, levada a público por Zen-Ruffinen, foi desencadeada pela falência da ISL (International Sports License), ex-principal parceira comercial da entidade.

Sua ruína gerou um processo na Justiça suíça em que executivos da ISL admitiram ter feito pagamentos a dirigentes esportivos.

Não foram dados nomes.

Foi também em um processo que o atual secretário-geral da Fifa, Jerome Valcke, complicou-se.

Nos EUA, a Mastercard processou a entidade por rompimento de contrato -hoje, o patrocínio é com a Visa.

A corte apontou que Valcke, então diretor de marketing da entidade, mentiu na ação. Sua atuação foi classificada como "qualquer coisa, menos fair play", alusão ao lema da Fifa.

A entidade teve de pagar US$ 90 milhões para a Mastercard. Valcke sofreu pressão dentro da federação, mas foi perdoado.

E virou secretário-geral.

Um dos vices da Fifa, Jack Warner, de Trinidad e Tobago, foi acusado de lucrar US$ 1 milhão com a revenda ilegal de ingressos para a Copa de 2006, na Alemanha. Warner recebeu somente uma multa e foi obrigado a devolver o dinheiro.

Contudo seu prestígio no Comitê Executivo seguiu intacto.

Segundo homem da Fifa -é vice sênior-, o argentino Julio Grondona foi investigado por comissão da Câmara de Deputados de seu país, em 2000.
Motivo: apurar possíveis irregularidades nos contratos de TV da AFA (Associação de Futebol Argentina).

Havia alegações de favorecimento a uma das redes nacionais.

Revistas argentinas apontaram o enriquecimento de Grondona à frente da AFA, mas sem apontar desvio de recursos da entidade.

Mais tarde, a investigação da Câmara foi arquivada, e Grondona seguiu forte.

O guatemalteco Rafael Salgueiro, também membro do Comitê Executivo, foi acusado por um ex-funcionário da federação local de vender camisas falsificadas da Adidas.

É da cabeça de homens como esses que saiu a decisão que vai nortear o investimento em infraestrutura do Brasil até o ano da Copa.

(RODRIGO MATTOS)

Presidente da CBF foi alvo de duas CPIs

DO ENVIADO A NASSAU

Assim como seus pares no Comitê Executivo da Fifa, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, passou por investigações dentro do Brasil.

Foi alvo de duas CPIs, na Câmara e no Senado, que apresentaram diversas irregularidades em sua gestão na entidade.

Entre outros pontos, o cartola foi acusado de evasão de divisas em empréstimos feitos pelo americano Delta Bank à CBF.

Por conta disso, Teixeira e seus subordinados foram denunciados pelo Ministério Público Federal.

A alegação era a de que a confederação pagou juros acima do mercado.

Mas o Tribunal Regional Federal trancou a ação no Rio.

Teixeira sempre negou as acusações.

Apontou que os empréstimos ocorreram durante crise econômica mundial na década passada, o que elevou os juros.

Usou taxas cobradas por outros bancos para embasar sua defesa.

Também na investigação da CPI do Futebol foi apontado que a CBF tinha prejuízo nas operações com a SBTR, então operadora de turismo da seleção brasileira.

Segundo a comissão, a empresa foi favorecida em R$ 30 milhões em três anos.

Mas a acusação nunca se transformou em processo criminal.

A PF indicou que não estava configurado crime, nesse e em outros casos.

O Ministério Público Federal discordou, mas não deu seguimento a ações até hoje. (RM)

Blatter coloca a culpa em "mídia direcionada"

DO ENVIADO A NASSAU

Dirigentes da Fifa sempre negaram as acusações de se favorecerem do futebol para enriquecer ou ganhar poder.

Mais atacado entre eles, o presidente Joseph Blatter foi também quem mais recorreu à mídia para se justificar.

"Você não pode imaginar o que é ser acusado por parte da mídia direcionada que diz que sou um homem mau. E vocês também são todos maus", defendeu-se Blatter, após a eleição em que foi acusado de comprar votos.

O vice-presidente Julio Grondona também afirma nunca ter se beneficiado dos cargos que ocupou. "Jamais, em nenhuma época, obtive vantagem. Sempre atuei em favor das entidades esportivas, porque essa é minha vocação. Amo o futebol, e na minha carreira nunca tive o lucro como objetivo."

Jerome Valcke admitiu seu erro na corte dos EUA, no processo contra a Mastercard.

Pediu desculpas e não sofreu maiores traumas.

Rafael Salguero e o russo Viacheslav Koloskov não falaram sobre as acusações sofridas em seus países. (RM)

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